Bruce Goldsmith Desing by Lucas Machado
Bruce Goldsmith
Pra quem não sabe, eu vou contar: Na década de 80 do século passado, as asas-delta dominavam os céus (osparapentes ainda eram pára-quedas que alpinistas malucos usavam para descer das montanhas). O cenário das competições era dominado por um triunvirato inglês, formado por John Pendry, Robbie Whittall e Bruce Goldsmith. Os três eram pilotos da mesma fábrica, a Airwave. Quando comecei a voar, meu primeiro ídolo foi Ildeu de Castro, o Dedeu, fera da Serra da Moeda, que voava uma Magic da Airwave e se vangloriava de sua asa ter resistido a um tumbling (capotada) dentro da nuvem. No primeiro ano de voo, participei de uma etapa do campeonato mineiro em Valadares, que foi seguido por uma competição internacional de cross country. Foi o primeiro contado que tive com os famosos skygods, que tanto lia a respeito nas revistas especializadas internacionais que já assinava. Minha asa tinha uma espécie de carenagem removível de dacron no king-post, onde eu escrevi “Top Ten Team” e saí colhendo autógrafos entre os feras
consagrados, com a ajuda de um amigo de infância, que reencontrei no voo, o grande piloto carioca Phil Heagler. Entre os que assinaram a lista, compareceram, além dos 3 ingleses, o americano e então recordista mundial de distância (500 km) Larry Tudor, o checo que seria o campeão mundial naquele ano, Tomas Suchanek; o francês e dono da La Mouette, Gerard Thevenot; além dos brasileiros Pepê Lopes, Paulo Coelho e o próprio Phil. Alguns anos e campeonatos mais tarde, logo após eu ter batido o recorde de
distância na Moeda com uma K4 da Airwave, recebi um telefonema do amigo Phil, perguntando se poderia receber o Bruce para uma conversa sobre negócios. Na época, eu já voava de parapente e os 3 ingleses também, sendo que tanto John Pendry quanto Rob Whittall se consagrariam como campeões mundial de asa e de parapente, feitos estes nunca mais igualados. Bruce, então, veio de Valadares para minha casa, onde me fez uma proposta de trabalho, em que eu seria o “braço” da Airwave no Brasil. Naquela ocasião,
minha carreira de médico ia de vento em popa e recusei a oferta, não sem antes me comprometer a ajudar, mesmo que informalmente, àquela lendária marca. Em 1995, retribui a visita, indo até a fabrica inglesa na ilha de Wight, de onde saí com o primeiro Alto Extreme – um protótipo de competição – da América Latina (com um atestado e tudo mais!). O tempo foi passando e os parapentes da Airwave, sempre projetados pelo Bruce, foram se sucedendo. Voei todos. Alguns, tive mais de um exemplar e em mais de um tamanho. Com a falência da companhia, provocada pela baixa procura e alto custo de produção das asas-delta, o famoso trio, junto com o contador da Airwave, Mike Cavanagh, e o jovem projetista e pupilo do Bruce, David Dagault, decidiram fundar uma nova fábrica de parapente, baseada nos Alpes marítimos franceses (em Bar Sur-Loup): a Ozone. Neste meio-tempo, Bruce se tornara um grande amigo. Sempre me visitava quando vinha competir no Brasil, já que gostava muito do voo na Moeda. Compartilhei seu casamento com uma princesa Viking, Arna Revnistdottir, o nascimento de seus três filhos, Tyr, Freya e Gunnar, ajudei a escolher nomes das velas, celebramos
juntos seu título mundial em 2007, fui chamado a opinar nas mais variadas circunstâncias de sua vida pessoal e profissional, que culminou, após uma mal sucedida tentativa de ressuscitar a marca Airwave, na fundação da BGD, a Bruce Goldsmith Design. É esta a marca que conta com meu apoio agora. Tenho acompanhado o entusiasmo que ele dedicou ao seu novo projeto, que, pela primeira vez, não passou pela “censura” do patrão, uma vez que agora ele é o próprio dono e pôde concretizar suas mais loucas idéias de design.
Assim nasceu o Tala, que tem esse nome porque tem duas talas (e não uma, como depraxe) em cada boca de célula. Além desta homenagem ao Brasil (dando o nome em português de sua principal inovação), a vela trás outras novidades, que prometem
rever alguns paradigmas no mundo dos projetos, como a estrutura interna que permitiu um menor número de células (50, no caso), possibilitando uma menor quantidade de linhas e uma grande diminuição no peso da vela, mesmo com um alongamento de 6,25; um sistema de tirantes que flexiona a vela diferentemente ao longo do bordo de ataque quando acelerada e um desenho nas linhas de freio que, junto com a estrutura do bordo de fuga, possibilita a atuação diferenciada ao longo do bordo de fuga, defletindo mais as pontas ou mais o meio, dependendo da posição em que se traciona a linha do freio. Isto, apenas para citar as características mais evidentes. Como uma deferência à nossa amizade, o Bruce vai mandar a primeira vela da BGD para o Brasil e deverá chegar na Moeda em meados de março. Espero que consiga, mais uma vez, o grande sucesso que merece, sendo ele, reconhecidamente, um dos maiores projetistas de parapentes do mundo.
Abs,
Lucas Machado